Seriado “O Sexo e as Nega”, exibido pela Rede Globo de Televisão |
Confesso que ainda não tinha assistido a um episódio completo do seriado “O Sexo e as Nega”. O dia e horário em que ele é transmitido coincide com as aulas que ministro na Escola de Comunicações e Artes na USP. Na terça passada, consegui assistir ao episódio, pois estive em um evento que me permitiu chegar um pouco mais cedo em casa. Como considero que é necessário, para dar mais sustentação às críticas que estão sendo feitas ao episódio pelo movimento negro, fazer uma avaliação mais empírica do seriado, procurei me atentar aos detalhes do seriado.
Primeira coisa que percebi: o seriado é muito ruim. A temática da sexualidade é tratada de forma bizarra e não convincente. No episódio que assisti, o tema foi “preconceito” (por que será a escolha deste tema?). As quatro personagens negras vão a uma loja de roupas. A sensualidade que tentam demonstrar é caricata, sempre fazendo poses sensuais, rebolando, como se todas as mulheres negras andassem assim o tempo todo no seu cotidiano. De tão forçado, as atrizes escolhidas para estes papéis tem o seu desempenho comprometido. Neste episódio, elas gritam, riem alto e rebolam no provador da loja.
A cena do preconceito também é exagerada. Por motivos que se imagina quais, as personagens são discriminadas por um segurança… negro! O mesmo desconfia que uma delas tenha roubado uma peça de roupa. A coisa vai parar na polícia e quem testemunha a favor das negras discriminadas é uma personagem… branca! Que, por um acaso, é patroa de uma delas. Moral da história: uma negra é discriminado por um negro e apoiada por uma branca que é a sua patroa. Maldade da senzala e bondade da Casa Grande.
Mas a maldade da senzala se redime… Na cama! Pois o mesmo segurança que praticou o ato de racismo, vai a casa de uma delas, pede desculpas e o caso acaba numa transa. Um outro conflito resolvido na cama também se dá entre a dona de um bar que demite um empregado negro – mas que, a pedido deste, é readmitido sob a condição de “prestar serviços sexuais” à patroa. Como Gilberto Freire preconizou em “Casa Grande e Senzala”, o sexo é o dirimidor dos conflitos sociais, raciais e de classe.
No meio das cenas, relatos sobre preconceito. Texto lido pelo próprio Falabela conclui que o preconceito está na cabeça das próprias pessoas que não se aceitam como elas são. Uma das personagens negras, em busca de emprego, aceita ser “mulata sambista” em um bar a la “Sargentelli” – recusa de início, mas cede ante a necessidade. E se afirma como “mulata” enfrentando o ciúme de um ex-companheiro. Ou outra personagem negra que, convidada a sair com um playboy branco, é discriminada por uma amiga dele em uma festa e se revolta dizendo que não é porque mora na periferia “é prostituta e drogada”.
No final, todas se confraternizam no boteco da mulher que contratou o empregado negro para favores sexuais. E comemoram com uma batida chamada “Chora nenê”. O episódio do preconceito termina com imagens de líderes como Nelson Mandela, Angela Davis, Martin Luther King, Malcolm X com as personagens negras cantando uma música contra o preconceito.
Afinal, como diz Falabela, preconceito é não se aceitar como é. No caso da mulher negra, é dizer “sou gostosa e daí?” e tirar proveito disto. Se vier o conflito, nada como uma boa transa. Afinal, foi assim que Casa Grande e Senzala se reconciliaram após as chibatadas e exploração do trabalho alheio. E a Globo e Falabela deram o seu recado sobre o que acham do preconceito.
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