15 de abril de 2015
Malina e Beck: presos e expulsos pela ditadura. |
Por
Carlos Ávila
A morte
recente da atriz Judith Malina, aos 88 anos, quase passou despercebida pela mídia
brasileira. Uma das fundadoras do Living Theater, ao lado de seu
companheiro Julian Beck (1925/1985), Malina manteve-se ativa por toda a vida,
no teatro e no cinema, desde o final da década de 1940 até os anos 2000. O Living –
que foi criado em Nova York, em 1947 – era um grupo de vanguarda, experimental
e radical, que propunha um teatro político e participativo (Paradise Now foi
seu espetáculo mais famoso).
Mas por
que nos toca de perto a morte de Malina? Particularmente, pela atuação do Living em
Minas, que se radicou por um breve período em Ouro Preto. O grupo veio para o
Brasil em 1970, a convite do Oficina de José Celso; naquele momento, Marina
& Beck eram nomes importantes na cena cultural – ao lado de gente como John
Cage, Merce Cunningham, Nam June Paik, Yoko Ono e outros ligados ao movimento
de arte multimídia Fluxus.
A vinda do Living para
o Brasil deu-se num momento tumultuado, em plena ditadura militar (governo do
general Médici). A repressão e a censura estavam por toda parte. Depois de
passagens pelo Rio e por São Paulo, o grupo se dirigiu para Ouro Preto na
tentativa de criar uma base de atuação ali, fazendo “teatro de rua” e
envolvendo a população da cidade nas suas performances.
Era a
época dos Festivais de Inverno promovidos pela UFMG – com cursos livres e
atividades culturais diversas – uma espécie de “válvula de escape” no sufoco
ditatorial. Para Ouro Preto seguia toda uma juventude embalada pela
contracultura, a vida alternativa, as drogas e a liberdade sexual. Em geral, os
espetáculos apresentados eram inovadores e experimentais (Smetak, por ex., com
seus instrumentos inventados, dentro da Igreja de São Francisco de Assis). Os
jovens curtiam; a população local ficava chocada e as autoridades militares
sentiam-se provocadas.
Ora, num
clima assim, imaginem como foi visto na cidade histórica o anárquico e
libertário Living – seus integrantes com roupas exóticas e
cabelos grandes. O grupo chegou a realizar algumas experiências teatrais com a
população (incluindo crianças e adolescentes, num grupo escolar em Saramenha),
mas acabou preso pelos militares, no DOPS, de BH, acusado de subversão e porte
de drogas (maconha). OLiving viu a repressão e a tortura de perto.
A prisão
de Malina, Beck e todo o grupo – formado por atores de várias nacionalidades –
repercutiu internacionalmente. Um abaixo-assinado, condenando a repressão no
Brasil e pedindo a libertação doLiving, foi publicado pelos jornais
daqui e de fora (120 assinaturas: Norman Mailer, Tennessee Williams, Arthur
Miller, Andy Warhol, Stanley Kubrick, Allen Ginsberg, John & Yoko, Mick
Jagger, Bob Dylan, Marlon Brando, Jack Nicholson, Jane Fonda e muitos outros).
O Living foi
expulso do país pela ditadura Médici. Durante o tempo em que ficou presa no
DOPS Malina escreveu um diário, que termina assim: “Julian está muito nervoso,
preparando pronunciamentos para a imprensa. O resto de nós está quieto e
triste. Nossos passaportes nos foram devolvidos com um enorme carimbo preto:
EXPULSO. Ah, Brasil, não foi em vão que te amei”.
Fonte: http://domtotal.com/blog/carlosavila/?p=614
Nenhum comentário:
Postar um comentário