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domingo, 18 de novembro de 2012

A Marca da Água com a Armazém Cia. de Teatro



Um comentário:

  1. O jornal O GLOBO publicou, em 26/09/2012, no Segundo Caderno crítica sobre A MARCA DA ÁGUA, escrita por Bárbara Heliodora. Leia abaixo, na íntegra:

    Mar de Emoções

    Bárbara Heliodora

    Um contido mas tocante texto de Maurício Arruda Mendonça e Paulo de Moraes, A Marca da Água, encenada na Fundição Progresso, festeja os 25 anos da Armazém Cia de Teatro. O título é expressivo para a história de Laura, uma mulher de 40 anos que, ameaçada desde a infância de ter o cérebro internamente inundado, nunca falou ao marido do problema, nem das cirurgias por que passou para evitar o pior. Agora, com vários episódios na vida envolvendo a água — como o afogamento do pai — ela volta a ter o problema da infância. O que é diferente, característico de Laura, é o fato de agora não querer se curar mas, sim, dar forma a seu sofrimento, uma fugidia mas implacável melodia dentro de sua cabeça. Entre a memória de episódios da infância, cenas reais e toda uma riqueza de visões, o caminho de Laura se afasta do de sua família na rotina cotidiana, mas a envolve sempre com pai, mãe, irmão e marido; no presente como no passado, ela é levada pela água, que a lembra de que a qualquer momento pode se dar, no cérebro, a inundação fatal.

    Um belo e austero cenário de Paulo de Moraes é formado por uma parede onde nascem passagem e espelho, e um pequeno lago com a água essencial à ação, tudo enriquecido pelo videografismo de Rico e Renato Vilarouca e luz de Maneco Quinderé. Os figurinos de Rita Murtinho, à prova d’água, são exatos, e Rico Viana dá o apoio necessário da música que persegue Laura e acompanha o clima da ação.

    Mas A Marca da Água pede algo mais para expressar o universo de Laura, real e imaginário: é muito bom o vasto peixe em cena, criado pelo Giramundo Teatro de Bonecos, como são também bons os barcos feitos por Eduardo Félix e a cabeça de escafandro, por Eduardo Andrade. A direção é de Paulo de Moraes, que como sempre conduz a ação com grande comedimento, emprestando ao texto todo o respeito que merece, sem sacrifício das linguagens cênicas; andamentos e marcas, como tons e gestos, são cuidada expressão do que o texto diz, assim como do que ele quer dizer.

    Integrado como está ao espaço na Fundição Progresso que ocupa há alguns anos, o elenco do Armazém já tem estilo próprio, contido, despojado, mas sempre muito bem trabalhado e construído. Lisa E. Fávero está modestamente bem na Mãe enfrentando a doença da filha. Ricardo Martins, Marcos Martins e Marcelo Guerra estão todos satisfatórios nos vários papéis masculinos. Mas cabe a Patricia Selonk a responsabilidade de levar a ação adiante no papel de Laura. A tentativa de aparência normal e o progressivo agravamento da doença, isto é, a ameaça da inundação total do cérebro, são cuidadosamente elaborados, em uma atuação contida em que raros momentos de humor afloram em meio à angústia da busca da música interior. A Marca da Água é um espetáculo contido mas comovedor, obra da dedicação permanente do Armazém à sua arte.

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